Novo livro expõe segredos ocultados por grupo pró-democracia há um ano. Descubra as revelações impactantes em suas páginas.

Um pacto de silêncio uniu os principais articuladores da “Carta às brasileiras e aos brasileiros em defesa do Estado democrático de Direito”, assinada por mais de 1 milhão de pessoas e lida no dia 11 de agosto do ano passado, na Faculdade de Direito da USP.

Ao longo de todo o processo, eles se negaram a compartilhar detalhes que pudessem sugerir ou induzir briga de egos. Não contaram de quem partiu a ideia original, não individualizaram a redação da carta, não divulgaram as tensões entre os diversos atores envolvidos.

Muitos desses segredos são agora revelados em “Bastidores: a Articulação da Carta às Brasileiras e aos Brasileiros em Defesa do Estado Democrático de Direito” (ed. Hucitec), do juiz federal Ricardo de Castro Nascimento, 61.

Com lançamento programado para esta segunda-feira (7), na livraria Martins Fontes da avenida Paulista, o livro traz o relato em primeira pessoa de quem, agora se sabe, lançou a fagulha inicial daquele movimento.

“Se fosse instalada uma disputa pelo protagonismo, não teríamos chegado tão longe”, escreve o juiz, num raciocínio acompanhado pelos demais articuladores de um documento crucial para conter o ímpeto golpista alimentado pelo então presidente Jair Bolsonaro (PL).

Daí por que, na cerimônia de leitura da carta, Antonio Roque Citadini, Dimas Ramalho, Luiz Antonio Marrey, Roberto Vomero Mônaco e Thiago Pinheiro Lima, além de Nascimento, fizeram questão de não subir no palco nem nos púlpitos.

O papel decisivo do sexteto é resgatado em “Bastidores”. Ao conjunto de fatos noticiados pela imprensa o juiz federal acrescenta outros, desconhecidos do grande público, mas nem por isso menos importantes para a cadeia de eventos que culminou no pátio da São Francisco.

Nascimento, de posse de registros no celular, cita desde nomes que se perderam no processo até aqueles que assumiram o proscênio na reta final; desde episódios remotos que só ganham relevância em retrospectiva até aqueles que ocorreram em rede nacional.

A carta, escreve ele, é uma obra coletiva. “O grande segredo do seu êxito é não ter dono. Tento explicar isso. Esse foi o maior ensinamento deixado. Não foi fácil domar os egos e as pressões”, diz no livro.

Como já era sabido, os seis articuladores, aos quais se juntaram Celso Campilongo e Ana Elisa Bechara, respectivamente diretor e vice da Faculdade de Direito, assumiram a paternidade do texto.

O que não se dizia, contudo, é que a versão inicial coube a Nascimento e que foi a partir desse esboço, preparado no dia 29 de junho, que os demais fizeram alterações de estilo e de conteúdo, com o objetivo de garantir o espírito suprapartidário desejado pela maioria.

Também sempre se soube pouco dos eventos ocorridos entre a fagulha e o fogo —ou, em outros termos, entre a ideia incerta que Nascimento começou a namorar em março e a sua viabilização a partir do fim de junho, com a formação fortuita do grupo de organizadores.

“Bastidores” lança luz sobre esses momentos de alegria, bem como sobre os medos que seu autor sentiu —por exemplo, quando soube que já havia a leitura de um manifesto de entidades programada para o 11 de agosto, também na USP.

Embora tenha acompanhado muita coisa, Nascimento não viu tudo, e ele faz questão de dizê-lo: “Passagens importantes não contaram com a minha participação direta, pois ficaram a cargo de outros agentes do processo. Não procurei a fundo descobrir como elas se passaram”.

Ele também escreve: “Optei por escrever na primeira pessoa, assumindo a parcialidade. Não quero e não devo ter o monopólio das possíveis narrativas”.

Em particular, Nascimento esteve menos presente na organização do ato em si, cujos preparativos ficaram a cargo da Faculdade de Direito e do grupo Prerrogativas, também responsável por atrair artistas para a manifestação política.

Campilongo e Bechara, que fazem o prefácio de “Bastidores”, afirmam que o relato de Ricardo Nascimento é fiel, mas dizem: “É claro que outras reconstituições poderão descortinar perspectivas inexploradas ou desconhecidas pelo autor. Ele mesmo destaca essa possibilidade”.

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